Um histórico apontando o caminho. A Turquia se prepara para cumprir sua quinta participação na fase final de uma Eurocopa com Senol Gunes ao leme, técnico que guiou a seleção otomana ao momento de maior brilhantismo em toda sua história: o terceiro lugar na Copa do Mundo de 2002 – se lembra daquela semi em Saitama, com gol de Ronaldo e vitória por 1 a 0? Pois é, Senol Gunes era o técnico e agora está de volta à chefia dos turcos.

A Eurocopa 2016 se revelou um fracasso para a Turquia, nação que terminou sua chave com três pontos, foi a pior das terceiras colocadas e falhou o acesso à fase a eliminar da competição que assinalou seu retorno a uma fase final, após ter ficado de fora da Eurocopa 2012. Agora, 13 anos após seu melhor resultado de sempre em uma Eurocopa quando caiu nas semis da Eurocopa 2008 – disputada na Áustria e Suíça – às mãos da Alemanha, a Turquia chega nesse Euro 2021 com legítimas aspirações no que toca à classificação para as oitavas. Vale lembrar que os turcos não marcaram presença na Copa do Mundo disputada há três anos, na Rússia.

Senol Gunes e suas opções para a Eurocopa 2020

Para boa parte da população turca, pouco haverá acima do futebol. O fanatismo do povo Otomano por seus times e sua seleção é impressionante e é esse ambiente efusivo das arquibancadas que a seleção turca quer colocar em seu jogo nesta fase final da Eurocopa. Comparando com o time que se apresentou há cinco anos atrás na Eurocopa 2016, a Turquia aparenta agora reunir melhores condições para rubricar uma prestação digna e pode muito bem apontar o acesso ao “mata-mata” como um objetivo. Inserida no grupo A junto com Itália, País de Gales e Turquia, os eleitos de Senol Gunes têm tudo para brigar pela ida à fase seguinte.

Senol Gunes é quase uma instituição na realidade do futebol turco. Enquanto jogador, dedicou praticamente toda sua carreira à defesa das cores do Trabzonspor, tanto que o estádio do clube, erguido em 2017, foi batizado com seu nome. Foi também no Trabzon que iniciou sua carreira de técnico no final da década de 80, tendo orientado o Trabzon por várias vezes em diferentes momentos da sua carreira. Vencedor de duas edições do campeonato turco (2015/16 e 2016/17), duas Copas (1994/95 e 2009/10) e uma Supercopa (2010/22), Senol Gunes teve o momento mais alto da sua carreira enquanto técnico ao guiar sua Turquia ao terceiro posto da Copa do Mundo em 2002, importando referir que esteve em funções entre 2000 e 2004. Em 2019, voltou a abraçar o projeto da seleção para render o romeno Mircea Lucescu, isso após passagens pelo seu Trabzonspor (a dois tempos), pelos coreanos do FC Seoul, pelo Bursaspor e finalmente pelas “águias negras” do Besiktas, emblema ao serviço do qual conquistaria, finalmente, o título turco. Aos 68 anos, será responsável por escolher e orientar a Turquia nessa Eurocopa 2020, pretendendo fazer valer sua liderança e carisma para uma equipe quer ir além dos grupos.

Foto: “Reuters/G.Fuentes”

O percurso de Senol Gunes nesse retorno à seleção turca nem começou de feição, dado que a equipe acabou caindo para a zona C da Liga das Nações da UEFA, algo que já tinha acontecido com Mircea Lucescu mas acabou não acontecendo por força de uma alteração estrutural promovida pelo organismo que gere os destinos do futebol europeu. No entanto, as eliminatórias para a Copa do Mundo 2022 começaram de feição: a Turquia recebeu e bateu a Holanda por quatro bolas a duas e, no segundo embate dessa tripla jornada de classificação, foi ao norte da Europa bater a Noruega de Erling Haaland por três a zero. O terceiro compromisso já não correu tão bem, com os turcos a protagonizarem uma das surpresas da ronda ao não ir além de um empate a três com a modesta Letônia. Dessa tripla jornada de qualificação fica o fato de a Turquia ter feito dez gols em uma sequência de três jogos, algo que nos permite aludir ao potencial que esse time reúne do ponto de vista ofensivo, sobretudo por conta da qualidade individual que reúne. Mais do que pela qualidade do processo, até porque Senol Gunes foi testando vários sistemas e dinâmicas sobretudo durante a Liga das Nações, essa Turquia deve ser tida em conta por conta do talento que tem. Está claro que isso não será suficiente para vingar em uma Eurocopa, mas Senol Gunes e sua equipe técnica estará hoje bem mais esclarecida à forma como usar as unidades que tem à disposição e transmitirá isso ao grupo durante o estágio de preparação para a fase final da competição. Nesse momento, Gunes poderá estar mais inclinado para basear sua estratégia a partir de um 1x4x3x3 com dois meias de maior contenção a permitirem que Çalhanoglu se aproxima mais da zona de decisão, com flanqueadores como Cengiz Under ou Karaman a pisarem também terrenos interiores a permitirem maior variabilidade no ataque. Por outro lado, Soyuncu e Kabak são jogadores com qualidade em construção e o recurso a um sistema com três defesas também poderá ser algo a considerar. O melhor será aguardar para perceber de que modo a equipe turca se apresentará nos amistosos de preparação.

 

Um ano de afirmação

A pandemias levou ao adiamento da Eurocopa e a realidade é que a temporada 2020/21 tem sido bem prolifica para alguns dos jogadores turcos. Comecemos pelo caso mais… invulgar.  Burak Yilmaz conta com mais de 60 internacionalizações ao serviço da seleção turca e não é propriamente um avançado desconhecido no panorama europeu. Revelado pelo Antalyaspor, o atacante que já foi artilheiro do campeonato turco por duas ocasiões passou por Masiaspor, Fenerbahçe (ainda que de forma fugaz), Eskisehirspor, Trabzonsport e Galatasaray antes de abraçar sua primeira experiência fora do país de origem. Em 2016, Burak Yilmaz viajou para a China para representar o Beijing Guoan e continuou marcando, mas a ligação terminaria a meio da época 2017/18, com o retorno ao Trabzonsport. Já acima dos 30, Yilmaz acabaria por se mudar para outro dos grandes turcos: o Besiktas. Concluída a época 2019/20, com 34 anos, chegou uma improvável oportunidade para atuar em um dos campeonatos “top 5”. Yilmaz se mudou para o Lille, da França, em uma nação em que o PSG é atualmente “rei e senhor” do futebol. Na altura em que escrevemos estas linhas falta uma jornada para o fim da Ligue 1 2020/21 e o Lille segue líder e bem vivo na luta pelo título e com muita responsabilidade turca à mistura, sendo que não falamos apenas de Burak Yilmaz. O “veterano” nos merece destaque por seus 17 gols em 32 jogos, mas também Yusuf Yazic e Zeki Çelik têm dado seus importantes contributos aos “Dogues”. Zeki Çelik, lateral direto de 24 anos, se prepara para participar da primeira grande competição de seleções seniores após três anos no Lille – tem 19 jogos na seleção turca. Yusuf Yazici, também com 34 anos, leva 14 gols em 41 desafios nessa época e também se deverá estrear em uma grande competição, ainda que leve já 30 encontros com a camisa da Turquia.

Nem só para o trio do Lille essa foi uma grande época esportiva. Ozan Kabak era, até o dia 1 de fevereiro de 2021, um nome certamente pouco conhecido na Europa do futebol. Aos 21 anos, o zagueiro natural de Ankara atuava em um Schalke 04 a definhar que acabou mesmo por cair para a 2. Bundesliga. A quantidade de lesões na zaga do Liverpool levou Jurgen Klopp a olhar para o mercado em seu país de origem e Ozan Kabak se transferiu mesmo para Liverpool, em uma mudança abrupta que obrigou o jovem a crescer “à força”. Agora, a expectativa é a de que Kabak conste nas escolhas de Kabak, podendo atuar no eixo defensivo junto de Soyuncu, jogador do Leicester que teve sua temporada afetada por lesões mas que acrescentará qualidade em construção ao jogo da equipe turca – ainda assim, tem Merih Demiral, da Juve, teoricamente na frente de Kabak nas contas da titularidade. Falando em lesões, também Cengiz Under, seu colega de equipa e compatriota, tem tido pouca sorte, falhando os últimos jogos do Leicester por esse motivo. E continuando por Inglaterra… Okan Yokuslu acabou caindo com o West Bromwich Albion, clube ao qual esteve emprestado pelos espanhóis do Celta, mas também deverá ser chamado à seleção.

 

Turquia na Eurocopa 2020

A Turquia chega no Euro 2020 com legítimas aspirações em relação ao acesso. A vitória no grupo A parece ser um objetivo demasiado ambicioso face à presença da Itália e as cotações das Casas de Apostas refletem isso mesmo, mas o equilíbrio deverá ser nota dominante na briga com as congéneres do País de Gales e Suíça, importando relembrar que os melhores terceiros colocados também se classificarão. Os turcos têm capacidade suficiente para bater de frente com galeses e suíços, se esperando no entanto que a equipa apresente maior consistência em termos de jogo e segurança atrás. Ofensivamente, a máquina está bem oleada e as unidades que a fazem trabalhar têm talento que sobra para cumprir, mas atrás há trabalho a fazer, precisando melhorar tanto em organização quanto em transição defensiva. Em suma, boa parte dos prognósticos em futebol consideram a hipótese de a Turquia chegar no “mata-mata”.

Recordes da Turquia na Eurocopa

A Turquia já participou de quatro edições da Eurocopa, a primeira há 25 anos, na Inglaterra. Para além da ida em 1996, a equipe turca esteve no Euro 2000 (Países Baixos e Bélgica), no Euro 2008 (Suíça e Áustria) e no Euro 2016 (França). A melhor prestação aconteceu com a chegada nas semis em 2008 e Smeih Senturk é o jogador com mais gols em fases finais de Eurocopas (3). Já no que à quantidade de jogos diz respeito, ninguém bate Rustu Reçber, com nove.

Antes de iniciar sua campanha no Euro 2020, a Turquia disputará três amistosos de preparação. A 27 de maio vai medir forças com o Azerbaijão, a 31 de maio tem embate com a Irlanda do Norte e a 3 de junho defrontará a Moldávia.

Boas apostas!